Como vocês já sabem pelo último post, o Boomer estava correndo em sua maratona (hospitalar).
Na quinta feira ele voltou para casa, "para nossa alegria"!!
Devo lhes dizer que ele não estava muito fácil de lidar naquele dia, mas era mais do que natural, já que ele tinha acabado de passar quase uma semana com tubinhos de plástico enfiados nas patas, e ele, por sua vez, enfiado numa gaiola.
Como é cruel esse negócio de deixar o cachorro internado. Talvez porque eu sempre achei que o Boomer era gente (ele também acreditava piamente nisso), e a diferença entre internar uma pessoa e internar um cachorro é brutal (mas não mais barata). Mas o que poderíamos fazer? Não tínhamos como monitorar todas as funções vitais dele aqui em casa, ajustar doses de remédios, etc, então o jeito foi deixá-lo lá.
Saber que seu amigo está enfiado numa gaiola, rodando em seu próprio eixo por causa da "doidera" que o Alzheimer causou no pequenino cérebro dele... foi uma sensação terrível para nós que ficamos aqui na expectativa, ligando para a internação de cinco em cinco minutos para saber como ele estava, como estava a pressão, se ele havia comido e/ou tomado água, etc., e percebíamos que, sempre que a responsável pela internação iria nos dar um resumo das "atividades" dele, ela checava um monte de papéis ao invés do nosso amigo. Enfim, acredito que eles fizeram, sim, o melhor que podiam com os recursos que tinham. - Uma responsável pela internação chegou a ficar irritada com a minha insistência em uma das ligações e confessou que ela estava cuidando de mais de vinte animais naquela noite ("e o kiko?"). -
Tá, ele voltou para casa "para nossa alegria", como eu ia dizendo. Montamos acampamento do lado dele, literalmente. Eu e minha mãe nos revezávamos para ficar de olho nele, mas a maior parte do tempo as duas ficavam por perto.
Montamos um "círculo" entre o sofá e o móvel da TV com almofadas para que ele pudesse girar à vontade sem se machucar. Ele estava irreconhecível para falar a verdade. Talvez já estivesse "mais para lá do que para cá", como se diz por aí.
À noite conseguimos que ele dormisse um pouco, mas ele só parava para deitar se nós o colocássemos deitado, e aí ele pegava num sono pesado em, tipo, meio minuto.
Durante a sexta feira, nós demos água e comida na boca, demos todos os remédios e cuidamos de tudo que estava ao nosso alcance (o resto era com ele).
Vou encurtar a história agora, porque começa a ficar triste, e eu não quero que nosso velho seja lembrado pelo único momento de tristeza que ele nos deu durante todos os dezessete anos de vida dele.
Por volta das 14h medimos a pressão lá no hospital: 200. Ele passou o dia moribundo, até que, quando ele parou de deglutir, decidimos que o sofrimento já estava demais para ele (para nós, esse limite já havia sido transposto há bastante tempo) e o levamos de volta para o hospital. Ele estava praticamente desacordado, com alguns poucos momentos de lucidez (será?). A pressão despencara para 130, a mais baixa que já medimos.
Conversamos com a Drª e ela foi o mais atenciosa e delicada possível. Optamos pela eutanásia. E preciso falar para vocês que eu acreditava que já havia me preparado para tudo, mas quando chega a "hora do vamo vê", Deus do Céu, como é difícil.
E como tomar uma decisão dessas? Quem é você para decidir até onde vai ou não a vida do seu amigo, eu perguntei uma vez para a querida R.L.. E ela me respondeu lindamente que "você vai sentir quando chegar o momento, não fique se preocupando com isso agora" (ou pelo menos foi isso que consegui depreender das palavras dela), e como ela tem muito mais experiência do que eu, e porque ela tem um coração maravilhoso, eu acreditei e aguardei o momento.
Realmente. Não sei como, nem de onde veio, mas nós sentimos, todos juntos, que aquele era, de fato, o momento. Que nós iríamos somente encurtar o caminho do sofrimento físico, e que ele cruzaria a linha de chegada mais tranquilo, sem tanto desgaste físico. E foi isso que aconteceu.
Ele lutou bravamente até o fim. Ele sempre foi muito forte. Forte a ponto de ganhar (com louvor, rsrs!) o apelido de Highlander entre o pessoal da internação. Na mesa onde fizemos o "procedimento", ele também queria lutar e dava seus espasmos para tentar ficar em pé, mas já não tinha força para mais nada. Lutar contra o quê, meu filho? Ele cruzou a linha de chegada às vinte'uma horas e cinquenta minutos, do dia sete de fevereiro de dois mil e quatorze.
Quem olhasse de fora acharia que ele estava dormindo um sono gostoso. E foi isso.
Eu não escrevi nada antes, porque, naturalmente, estava arrasada (e ainda estou, mas agora já consigo sentir saudades sem sentir dor). Não por ele, é claro, pois acredito e estou convicta de que agora sim ele vive e poderá dar continuidade ao seu ciclo evolutivo, como todos também daremos. Ele simplesmente passou desta dimensão terceira, física, material, para uma outra dimensão onde o sofrimento físico já não é mais necessário, pois a forma de viver é mais sutil.
Se me permitem um conselho, vocês também, amigos, não fiquem tristes com a morte de seus peludos. Se permitam a tristeza pela saudade, mas jamais pela morte.
Agora nós estamos no processo de nos alegrarmos novamente com a vida e com a oportunidade que nos foi concedida de termos um amigo querido. Um amigo que espera atrás da porta todos os dias, e, mesmo levando portadas na cabeça de vez em quando, não esmorece até nos ver chegar; que gosta de fazer os outros sorrirem; que faz festa por qualquer motivo; que se alegra pelo simples fato de estarmos por perto. Enfim, um amigo que nos ama incondicionalmente.
Descanse em paz, Boomerzinho, e vá brincar bastante com os amigos de outros amigos que também já cruzaram a linha de chegada como você. Nós te amamos muito! Obrigada por tudo, sempre!
Desenho que meu namorado fez no dia que nosso velho partiu. Bom humor sempre! Rsrs! |